Por que educação deve olhar para alta nos diagnósticos de autismo como algo além da saúde

  • 20/04/2024
(Foto: Reprodução)
Para especialista, aumento nos diagnósticos era previsto, mas sistema de ensino não se preparou. Agora profissionais devem avaliá-lo pelo ponto de vista do comportamento. IMAGEM DE ARQUIVO: Estudante fazendo prova Reprodução Em uma sala com 36 alunos, ao menos um será autista. O número segue uma estimativa divulgada pelo Centro de Prevenção e Controle de Doenças dos Estados Unidos (da sigla em inglês CDC), que em 2020 apontou um aumento na prevalência de criança com a condição. O cenário é reforçado pelos dados das redes municipal e estadual de ensino de Campinas (SP), que viram o número de autistas nas escolas crescer em 25 veze ao longo de uma década (confira detalhes no gráfico abaixo). Cerca de 20 anos antes, o Transtorno do Espectro Autista (TEA) parecia menos frequente, sendo previsto em uma a cada 150. O problema é que, segundo especialistas, embora o aumento fosse esperado, a capacitação dos profissionais de educação não acompanhou o mesmo ritmo. 📲 Participe do canal do g1 Campinas no WhatsApp No mês em que são celebrados os dias Mundial de Conscientização Sobre o Autismo e o Nacional da Luta pela Educação Inclusiva, o g1 Campinas conversou com especialistas e levantou números para entender: como a educação deve se preparar para atender essa demanda crescente? Para a psicóloga Camila Canguçu, supervisora do Programa de Atenção aos Transtornos do Espectro do Autismo (Pratea) da Unicamp, este é o momento da área se abrir para entender o autismo a fundo e criar os recursos necessários para atender estudantes de todas as idades. “Esse aumento nos diagnósticos era esperado. O que não aconteceu foi a preparação dos profissionais que trabalham, mas tenho visto que muitos estão procurando essa capacitação. Eles mostram interesse e eu vejo que isso é muito positivo”, ressalta. 🧠 Nesta matéria você vai conferir: O aumento em números Por que falar do acesso dos autistas à educação O que é uma educação preparada para entender e atender autistas O que tem sido feito O que dizem os números Dados enviados pelas secretarias Municipal e Estadual de Educação dão uma demonstração do quanto cresceu o número de autistas matriculados nas escolas de Campinas (SP). Em 2014, na rede municipal de ensino, eram apenas 43, mas 10 anos depois chegou a 1.083. Já na rede estadual o salto foi de 84 para 581 (veja o gráfico abaixo). Alunos autistas matriculados na rede municipal de ensino de Campinas Por que é importante falar do acesso dos autistas à educação? Letícia Sabatella fala sobre o diagnóstico tardio de Transtorno do Espectro Autista, aos 52 anos: 'sensação libertadora' Segundo o Manual de Diagnósticos e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), o TEA é uma condição atípica do neurodesenvolvimento humano – que surge na formação do cérebro – e é caracterizada, principalmente: por atraso ou a dificuldade da linguagem (incluindo habilidades de comunicação e socialização); rigidez cognitiva (o que envolve comportamentos repetitivos ou rígidos); disfunções no processamento sensorial (como alta sensibilidade). Esses critérios são fundamentais para o diagnóstico, mas podem se manifestar de formas diferentes em cada pessoa. Além disso, o TEA é classificado pelo nível de suporte que o paciente necessita para desenvolver suas tarefas. A escala vai de 1 a 3 (de menor a maior necessidade de auxílio). Levando tudo isso em consideração, é válido dizer que alunos autistas podem necessitar de suporte específico para se desenvolverem na sala de aula. Por isso, é importante que educadores e outros profissionais entendam suas características, como exemplifica Camila Canguçu. "Aprender a brincar é um requisito fundamental na infância, só que a criança autista pode não ter a habilidade, os recursos, para brincar com os colegas ou fazer com que brinquem com ela. Aí a criança tenta, mas não tem ninguém para fazer a mediação", fala a psicóloga. "Essa criança vai tentar uma, duas vezes. Não vai conseguir e vai parar. Ela vai começar a apresentar comportamentos que atrapalham a interação social, que podem ser de frustração, agressividade, isolamento. Simplesmente porque não teve um mediador para ajudar nessa comunicação". ☝️ Dessa forma, a especialista pontua que se os diagnósticos de autismo estão se tornando mais recorrentes é fundamental que as escolas tenham, o quanto antes, profissionais que compreendam as limitações causadas pelo TEA e possam dar o suporte necessário ao aluno. O que é uma educação preparada para entender e atender autistas? Camila Canguçu, doutora em psicologia, analista do comportamento e supervisora do Pratea da Unicamp Arquivo Pessoal Para a doutora, um profissional capacitado para atender pessoas com TEA na educação é aquele que olha pelo ponto de vista da análise de comportamento. “Não é apenas fazer com que as pessoas saibam do TEA do ponto de vista da saúde. É capacitar esses profissionais com dicas e estratégias para que saibam observar e entender essas pessoas no espectro”. “Com a análise do comportamento, o profissional vai poder dizer: 'esse meu aluno hoje está mais agitado', e pensar o que está causando isso. Às vezes pode ser algo no ambiente, uma mudança na luz, uma mudança no lugar que ele se senta, ou até barulho. Com isso, o profissional já consegue fazer os ajustes”, exemplifica. LEIA TAMBÉM: O QUE EXPLICA? Entenda por que número de casos aumentou tanto nas últimas décadas CARA DE AUTISTA: Pessoas com TEA relatam como estereótipos geram preconceito e afetam acesso a direitos 📢 Mas, atenção: a ideia não é dar mais uma função para o professor. Segundo Camila, é importante que os professores detenham desse conhecimento, mas eles não devem atuar sozinhos. Ela defende a oferta de mediadores escolares, que são pessoas responsáveis por otimizar a rotina da sala de aula, mediando a interação entre aluno, escola e educador. Assim, professores não serão sobrecarregados. “Na escola, se você tem um autista de nível 2 de suporte em uma sala com 40 alunos, é necessário ter um mediador junto ao professor para perceber as demandas dessa criança e ajudar a nivelar. Se não, a professora não vai dar conta de passar o conteúdo igual para todos”, comenta. “Eu preciso entregar ao professor um ambiente em que ele consiga trabalhar. Se eu não tenho um suporte a mais, um mediador, o professor não vai conseguir exercer a função dele de forma adequada. E mais: como um aluno PCD vai estar integrado se eu não tenho uma pessoa para ajudar na comunicação e interação?”. Com formação na Unicamp, Guilherme de Almeida é autista e ativista pela educação inclusiva Cibele Barreto/Divulgação O professor Guilherme de Almeida, que é autista e ativista em educação inclusiva, reforça que compreender a condição é observá-la como algo além da condição médica e que está longe de ser um problema. "O professor não tem que ser um especialista no diagnóstico, na condição médica. Ele tem que ser um especialista em ensinar, independentemente". "Achar que a criança [autista] é um problema, eu acho uma violência sem tamanho. A expectativa é que os educadores e os grandes realizadores de políticas públicas tenham essa compreensão de que a gente não é um problema. Os problemas é que derivam da falta de condição para os educadores e são eles, os educadores, que a gente tem que fortalecer para façam o seu trabalho". 💡 O que tudo isso quer dizer? Camila e Guilherme defendem que não basta que o sistema de educação observe o autismo como uma condição médica. É importante entendê-lo como uma questão comportamental, cercada por particularidades, que influenciará diretamente no aprendizado. O que tem sido feito? Vista aérea do campus da Unicamp, em Campinas (SP) Reprodução/EPTV Atualmente, o Programa de Atenção aos Transtornos do Espectro do Autismo (Pratea), supervisionado por Camila e ligado à Faculdade de Medicina da Unicamp, desenvolve iniciativas para contribuir com a melhora na assistência de pessoas autistas em diversas esferas, inclusive na educação. Entre as atividades realizadas estão cursos, palestras e um simpósio anual. Ministério Público A preocupação com o acesso dessa população ao ensino também motivou uma ação da Promotoria de Justiça de Campinas. Um inquérito instaurado pelo promotor Rodrigo Augusto de Oliveira na última quarta-feira (10) quer apurar a existência de cursos de pedagogia que contemplem a formação de docentes para o apoio especializado a alunos com deficiência. O procedimento leva em consideração o volume expressivo de pedidos para a garantia de profissionais aptos a acompanhar, em sala de aula e nos estabelecimentos de ensino, crianças e adolescentes com deficiência matriculados nas escolas públicas do município. Para isso, foram expedidos ofícios para instituições de ensino, diretoria de ensino e secretaria de educação. A expectativa é entender, entre outros pontos: Se há cursos e disciplinas para formação de professores para atuar no apoio escolar; Se as partes acham relevante a realização de uma reunião para tratar do tema juntamente a órgãos de educação, instituições e entidades representativas; Quais as dificuldades encontradas no atendimento a essa demanda. “Mediante às respostas, nós vamos compilar, vamos verificar quais são esses eventuais problemas, dificuldades e, quem sabe, fazemos essa escuta social para travar um diálogo”, conta o promotor. “[Depois] a gente pode buscar uma recomendação às instituições, podemos tentar estabelecer um compromisso de ajustamento de conduta e, em última análise, até uma ação civil pública”. Redes de ensino público O g1 questionou a Prefeitura, o Governo do Estado de São Paulo e a Universidade Estadual de Campinas sobre o que têm sido feito para garantir o suporte necessário a esses estudantes. Confira as respostas abaixo: 👉 Prefeitura de Campinas A Secretaria Municipal de Educação informou que oferece serviços e recursos considerando a educação inclusiva. Disse também que “as 208 escolas contam com professores de educação especial, que têm a missão de oferecer um suporte especializado para o aluno, assim como são responsáveis pelos processos pedagógicos e pela articulação dos processos inclusivos”. Informou também que são disponibilizados cuidadores, “que são o apoio para que as crianças possam fazer as refeições, higiene pessoal, assim como, se locomover pela escola, no caso dos cadeirantes”. Há ainda três alunos com acompanhantes terapêuticos, que não são oferecidos pela pasta, mas, sim, uma escolha da família juntamente com o médico que acompanha a criança. Além disso, há um conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos que complementam ou suplementam a escolarização nas chamadas salas de recursos multifuncionais. A Secretaria de Educação destacou que oferece outros serviços, o que inclui: Centro Multidisciplinar de Apoio, Pesquisa e Assessoria à Educação Especial Inclusiva (Cemapa), que orienta profissionais da rede sobre recursos e materiais sobre inclusão; Centro de Produção de Materiais Adaptados (Cepromad), que produz, adequa e disponibiliza materiais didáticos acessíveis; Gestão e Apoio à Inclusão de Alunos com Altas Habilidades/Superdotação (Gaiah) - destinado aos alunos com altas habilidades/superdotação; Apoio aos Processos Inclusivos com estagiários; Formação continuada aos profissionais da rede municipal. 👉 Governo do Estado de São Paulo A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo destacou que "a promoção de políticas públicas inclusivas e o apoio sistemático aos alunos da educação especial são compromissos" e que "Todos os alunos elegíveis são avaliados para apoios, recursos e serviços complementares necessários, incluindo material, mobiliário, estrutura, recursos pedagógicos e de tecnologia". A Seduc-SP informou que oferece, de acordo com cada caso, a assistência de um Profissional de Apoio Escolar (PAE) que presta serviços contínuos de apoio nas atividades de alimentação, locomoção e higiene, incluindo o suporte necessário durante as atividades cotidianas, garantindo a equivalência ao estudante. Também há Atendimento Educacional Especializado (AEE) no contraturno "com a orientação de professores especializados e com instrumentos de acessibilidade e estratégias pedagógicas eliminadoras de barreiras que possam impedir o desenvolvimento da aprendizagem". A rede ainda conta com professores do projeto Ensino Colaborativo, que estão presentes em todas as escolas e coordenam as atividades da educação inclusiva. "Os educadores da rede estadual recebem formação continuada, por meio da Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores (EFAPE), para o desempenho de suas atividades. Em 2023, a Seduc-SP implantou o Programa Multiplica SP, ação inédita e que consiste na formação entre pares. O objetivo é o aprimoramento de práticas pedagógicas e a formação colaborativa entre docentes, por meio da troca de experiências e o compartilhamento de saberes". 👉 Unicamp A Universidade Estadual de Campinas aprovou na última terça (9) a criação do Programa de Atendimento Educacional Especializado. A iniciativa surgiu por meio das ações da Diretoria Executiva de Apoio e Permanência Estudantil (Deape), que observou o aumento no número de estudantes com deficiência que solicitavam apoio para desenvolver atividades. "A gente faz uma entrevista e vê quais tipos de adaptação precisa ser feita para aquele caso. A gente informa a coordenação de curso e, semestralmente, fazem um trabalho com os professores. Isso era feito informalmente e já atendeu 35 pessoas. Agora será formalizado como definitivo", detalha Adriane Pelissoni, coordenadora de carreiras e vida estudantil. As adaptações variam de acordo com a necessidade do aluno, mas podem incluir mudanças na estrutura da sala de aula e na rotina, como disponibilidade de mais tempo para realizar uma prova, por exemplo. O g1 também pediu um posicionamento ao Ministério da Educação e aguarda retorno. VÍDEOS: Tudo sobre Campinas e Região Veja mais notícias sobre a região na página do g1 Campinas.

FONTE: https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/educacao/noticia/2024/04/20/por-que-educacao-deve-olhar-para-alta-nos-diagnosticos-de-autismo-como-algo-alem-da-saude.ghtml


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